Desde sua performance no Superbowl, em 2020, Shakira vem demonstrando mais e mais atenção com seus figurinos. Se a colombiana não tem exatamente um senso fashion apurado a ponto de torná-la um ícone da moda – embora aproximações com o mundo da moda tenham ocorrido desde então, seja com sua aparição na semana de moda de Paris, em 2023, ou suas duas incursões no MET Gala, em 2024 e 2025 – suas aparições públicas desde então demonstram uma clara guinada no que diz respeito à atenção que a loira dedica ao que veste.
Tudo isto, é claro, se deve ao trabalho do stylist Nicolas Bru, que trabalha com Shakira de maneira intermitente desde sua performance na final da Copa Davis, em 2019. Se até então boa parte dos figurinos de Shakira era composta por peças sem etiqueta, feitas sob medida por membros de sua própria equipe seguindo diretivas muitas vezes dadas pela própria cantora (como é o caso dos já famosos bikinis de franjinha que vez por outra ela exibe nas redes), Bru trouxe a alta moda para o centro da própria lógica visual dos figurinos dela, unindo polimento e beleza à inegociável funcionalidade da qual ela não abre mão.

Nos idos 2014, durante a divulgação do disco ‘SHAKIRA’, a dupla de stylists Rob & Mariel já haviam trazido um pouco de refinamento à imagem de Shakira, mas um trabalho que se restringia às suas aparições públicas, especialmente aos tapetes vermelhos e filmagens em geral. No resto do tempo, Shakira continuava misturando peças antigas de seu guarda roupas pessoal a peças novas, claramente montando seus próprios looks para aparições consideradas de menor escala ou performances.

Este trabalho de superfície se torna aparente quando chega a era El Dorado. Com um disco marcado pela ausência quase absoluta de divulgação e aparições públicas, Shakira volta a trabalhar com a estilista Marjan Malakpour, com quem já havia trabalhado anteriormente em 2006 criando looks diversos para o álbum Oral Fixation Vol. 2 e a Oral Fixation Tour, em uma nova lógica de trabalho que parece ter como foco a geografia: Shakira passa a priorizar artistas baseados em Barcelona, como o artesão Gustavo Adolfo Tarí, que esteve envolvido virtualmente em todos os trabalhos de Shakira de 2017 até agora ( ele trabalhou em looks de ‘Pero Fiel’,’ de ‘Copa Vacia’ e ‘Te Felicito’, para citar só alguns).
A turnê daquele disco, a El Dorado Tour, traz, do ponto de vista da indumentária, todos os elementos da Shakira “clássica”: um guarda-roupas simples, funcional, que permite trocas rápidase que investe na beleza de maneira pontual (como era o caso do belíssimo figurino criado para ‘Whenever Wherever’.
Com tudo isso em mente, foi um grande choque para o fandom como um todo quando a Las Mujeres Ya No Lloran World Tour estreou no Rio de Janeiro em fevereiro de 2025 trazendo nada menos do que 13 figurinos belíssimos que alternam entre grandes atêliês de moda com artistas locais de diversas partes do mundo. Por isso, a partir de agora, nós vamos rankear todos os 13 looks na ordem do que consideramos os mais interessantes – e você pode, ou melhor, deve discordar de nossa opinião. Vamos lá?
#15: La Fuerte

O primeiro look do show, um macacão predominantemente branco trabalhado com a famoa greca Versace, certamente é uma boa escolha para o começo do espetáculo, quando Shakira surge do meio do público acompanhada por fãs e seus dançarinos. Apesar de delicado em sua simplicidade, o look fica certamente apagado quando comparado ao que vem pela frente, além de sua silhueta deixar bastante óbvio que trata-se de um look destacável que esconde outro figurino por baixo.
#14/ #13: Inevitable/ Donde Como y Cuando

Os looks usados durante as performances de ‘Como Donde y Cuando’ e ‘Inevitable/ Empire’ aparecem rankeados , respectivamente, nas posições, #14 e #13 pelo mesmo motivo: além de não serem entradas exatamente justificáveis, os dois têm um aspecto claro de serem sobreposições. Para não dizer que não falamos bem, o look dourado, criado por XXXX, incorpora bem os detalhes do look rosé que aparecem, enquanto o look branco funciona muito bem com a paleta vermelha usada nas peojeções de ‘Inevitable’, criando um belo contraste.
#12: Chantaje / Monotonía / Addicted to You / Loca / Soltera

No bloco que começa com ‘Chantaje’ Shakira veste um lindo conjunto em malha metálica criado pelo estilista Michael Schmidt. Apesar de belas e especialmente enriquecidas pela cor escolhida, em tons rosé que variam em degradê, as peças são versões alternativas idênticas daquelas usadas na final da Copa América (prateadas) e na aparição no programa Domingão do Hulk (douradas). Além disso, a escolha do look mostra como Shakira tem uma tendência grande a repetir silhuetas que lhe agradam: a combinação de top e mini saia com fenda ampla do lado esquerdo já havia sido explorada no Superbowl e na performance do MTV Vanguard antes mesmo que ela usasse o primeiro dos três looks de Schmidt.

#11:Girl Like Me / Las de la Intuición / Estoy Aquí

É exatamente esta repetição de silhueta que traz este look rosa criado pela casa Versace para a décima colocação. Aqui, optamos por separar as duas versões deste look, que tem como base um body cor de rosa e sobre o qual entraremos em detalhe mais adiante.
#10 Copa Vacía / La Bicicleta / La Tortura / Hips Don’t Lie

Em décimo lugar fica o belo e delicado vestido criado pela designer Natalia Fedner, baseada em Los Angeles. Criado a partir de muitos e muitos metros de chiffon de seda tingidos manualmente em 3 tons diferentes e correntes de metal, o vestido traz a marca registrada de Fedner, com um trabalho tricotado que dá a ilusão de nu ao fundo. Esta não é a primeira vez que Shakira e a designer trabalham juntas: ela já havia criado o conjunto que a colombiana usou durante sua rápida aparição no festival Coachella de 2024. O modelo conta ainda com uma versão alternativa, em vermelho, feita pela mesma artesã para a performance no programa de Jimmy Fallon e que foi usada também no festival Sueños.
#9 Ultima

Durante a era ‘SHAKIRA’, a colombiana repetidamente vestiu criações de Zuhair Murad em tapetes vermelhos. Com peças que emulam o glamour cinematográfico e que contam com trabalho manual delicado, as peças do designer libanês tiveram papel fundamental no polimento da imagem de Shakira naquela época. Assim, é um grande prazer vê-los colaborando novamente nesta linda peça feita com 350 pedaços de espelho e 10 mil cristais. Em mais uma linda referência, que tem como inspiração a capa do álbum que dá nome à turnê, esta peça parece ainda uma versão elevada do vestido usado por Shakira na festa de lançamento de seu disco El Dorado, criado por Gustavo Adolfo Tarí.
#8 She Wolf/ Session 53


Uma coisa que a era ‘Las Mujeres Ya No Lloran’ trouxe para a estética de Shakira foi a experimentação com novas silhuetas. Do corpete de latex de ‘Te Felicito’ à silhueta oversized de ‘Monotonia’ e ‘Sessions 53’, a colombiana brincou aqui e ali com novas oportunidades de mostrar seu corpo. Uma delas foi o lindo macacão Jean Paul Gaultier criado sob medida para o Grammy latino de 2023. Por isso, este look criado pelo brasileiro Dario Mittmann para o encore do show, embora se encaixe perfeitamente à estética punk/ eletrônica da reta final do espetáculo, peca por repetir excessivamente o formato daquele outro – algo provavelmente feito à pedido da própria Shakira. Ainda assim, o lindo trabalho de Mittman chama a atenção pelo trabalho de estamparia – criada pelo próprio artista através de um processo de impressão realizado por ele próprio que tem como intuito de emular tatuagens.
#7 Whenever Wherever

Para a reta final do show antes do encore, a palavra-chave é referência. Se, antes de tudo, Shakira repete aqui a sequência final ‘Poem to A Horse’/ ‘Objection (afro-punk)’/ ‘Whenever Wherever’ usada no setlist da Tour of The Mongoose – sua primeira turnê de proporções mundiais, o fato de aqui esta tríade ser seguida de mais três hits sinaliza claramente ao quanto a carreira da colombiana se expandiu desde então. Como se não fosse o bastante, os dois looks deste segmento são referências diretas ao figurino daquele show e este, especificamente, criado pelo artesão norte-americano Gunnar Deatherage, é quase uma releitura do visual usado por Shakira para ‘Whenever, Wherever’ naquele espetáculo. Desde top em couro, que recria a silhueta recortada criada para o clipe da faixa, até os inúmeros detalhes incorporados à saia de franjas, que mais parece uma versão ampliada do cinto usado em 2002. Repare como as argolas, os detalhes em correntes, a paleta de cores e até mesmo o cordão com pingente de cruz. Todos os detalhes estão lá.
#6 Ojos Así

A escolha da designer indiana Anamika Khanna pela cor vermelha ao criar o conjunto vermelho usado por Shakira em ‘Ojos Así’ na primeira parte da turnê é bastante óbvia e autoexplicativa. Um dos visuais mais famosos – e icônicos – da colombiana é aquele em que ela usa os cabelos loiros soltos, top e uma saia de franjas vermelhos trabalhados em pedrarias. A imagem, feita durante uma performance em um evento de comemoração ao ano novo na China, na virada de 2010 para 2011, representa tão bem a marca Shakira que serviu com base para a criação da personagem Gazelle, na animação Zootopia e também é a inspiração para o visual multipropósito criado para o Superbowl 2020.
Trabalhada com bordado manual intrincado, a peça é construída em camadas de vermelho-escuro, carmesim e escarlate e cravejada com cristais Swarovski que brilham a cada movimento.

#5 Waka Waka (This Time for Africa)

O look vibrante escolhido para ‘Waka Waka’ traz muitos elementos interessantes. Criado com retalhos de tecidos que trazem muito movimento e repleto de pequenos alfinetes que trazem um pouco do aspecto informal do designer jamaicano-trinitense Jawara Alleyne, conhecido por uma abordagem que une arte, cultura caribenha e sustentabilidade. A escolha por misturar tons vibrantes é sem dúvida uma referência ao look usado por Shakira no final da Copa do mundo de 2006, criado por Roberto Cavalli e que misturava diversos tons neon.
#4 Acrostico

Um aspecto curioso – e até mesmo divertido – de Shakira é como a cantora parece associar baladas a vestidos. E se eles forem gigantescos (‘No’, Oral Fixation Tour), bufantes (‘Antes de Las Seis’, Sale el Sol Tour) e até injustificaveis (‘Toneladas’, El Dorado Tour), melhor ainda. Aqui, felizmente, ela eleva essas características às proporções nababescas do espetáculo vestindo uma criação de Gaurav Gupta Couture.
Além de deslubrante, o vestido Lunar Blue Wolf Gown atende a múltiplas funções de maneira simultânea: primeiro, a de não deixar que Shakira se perca, mesmo parada durante toda a performance, em um palco gigantesco. Além disso, a peça, que precisou de mais 600 horas de trabalho para ficar pronta, ainda consegue amarrar dois conceitos distintos: o peitoral metálico moldado ao corpo adornado com o icônico símbolo da loba remete à ideia maternal da canção ‘Acróstico’ enquanto a saia em organza, fluída, quase teatral, com camadas que lembram ondas oceânicas, se conecta de maneira perfeita ao interlúdio que vem a seguir.
#3 Pies Descalzos, Sueños Blancos / Antología / Poem to a Horse / Objection (Tango)

Um dos pontos altos do guarda-roupas da turnê é este conjunto criado pela designer brasileira Ligia Morris e sua empresa, a primal Stuff, e o contexto é essencial para entender e valorizar o belo trabalho feito aqui. Como já mencionamos no #6, a reta final do show tem um aspecto muito forte de ode ao começo da carreira internacional de Shakira. O look todo vermelho, composto de calça e colete, é uma recriação de duas peças usadas por Shakira naquela era, além de ser uma representação fiel do que era o look da era Laundry Service, com inspiração forte do glam rock. Como se não fosse o bastante, Morris foi a responsável por quase todas as peças e looks usados por Shakira durante aquela era, desde os visuais da capa do disco, do clipe para ‘Whenever Wherever’ e todos os visuais da turnê do Mangusto
#2 Ojos Así

Aqui está nossa teria para a sequência de acontecimentos: para sua performance no Grammy 2025, que aconteceu poucos dias antes da estreia da Las Mujeres ya No Lloran Tour, Shakira optou por apresentar uma versão editada da performance de Ojos Así da turnê junto com o número de ‘Sessions 53’. Para a ocasião, ela e Nicolas Bru encomendaram um look reversível à casa de costura italiana Etro, modelado a partir da silhueta do look criado por Anamika Khanna, que àquela altura já estava pronto e ajustado.
Nossa suposição é que Shakira gostou tanto do figurino criado por Etro, um top em tule e leggings com bordados paisley em tons de bronze e ouro, acompanhados de uma saia em camadas com franjas de seda, cristais e detalhes metálicos, que encomendou uma versão alternativa dele para usar em seu espetáculo. Enquanto a versão para o Grammy apostava em uma paleta de cores que evocava o deserto e o Oriente médio, esta nova versão, que deixa de lado as leggings por não precisar ser reversível e troca as franjas de seda por cristais que cascateiam pelos quadris, investe em uma combianção de branco e dourado que ao invés de se misturar aos backdrops vermelhos, como o trabalho de Khanna, opta por contrastar com ele. Sem sobra de dúvidas, não epanas um dos looks mais belos do espetáculo mas um dos figurino mais lindos e delicados já vestidos por Shakira
Mas se o visual é tão lindo, como não é o primeiro lugar desta lista? Bom, por que para nosso vencedor o buraco é bem mais embaixo:
#1 Te Felicito / TQG / Don’t Bother

Durante sua turnê Oral Fixation, de 2006/07, Shakira usava uma linda guitarra Fender Mustang para o número ‘Don’t Bother’. A peça era mesma usada no clipe da canção, com uma pequena, embora nada sutil diferença: o instrumento havia sido encrustado com aproximadamente 2 mil cristais swarovski na cor rosa em uma oficina da marca na Espanha, por onde Shakira começaria aquela turnê. A ideia era simples e recorrente quando se fala em turnês de Shakira: Com um espetáculo surpreendentemente simples, o instrumento era responsável por um toque de beleza e glamour.

Em 2019, por um destes movimentos aparentemente sem motivo aparente das redes sociais, o clipe da música atingiu a nona posição no Global YouTube Music Videos Chart durante a semana de 20 a 26 de setembro após conseguir 22,9 milhões de visualizações nesse período. À época, Shakira até mesmo postou uma foto do instrumento:

Com todo este contexto, ao montar o setlist de uma turnê cujo disco de suporte retrata a jornada de sofrimento após uma traição e término, fazia sentido incorporar uma música que trata sobre fala sobre desilusão amorosa, autoestima ferida e empoderamento após o abandono.

Assim, o visual rosa criado pelo Ateliê Versace tem como inspiração exatamente a Fender rosa (que até pouco tempo atrás estava exposta em uma exposição com peças de Shakira no Museu do Grammy). Enquanto a primeira versão do look, usada ainda no primeiro segmento do show, repete uma modelagem já usada à exaustão por Shakira, esta segunda forma conta com uma saia plissada que se incorpora ao body criando um belo minivestido, esta sim uma silhueta pouquissimo explorada por Shakira em performances, salvo em algumas ocasiões durante a era She Wolf.
Para nós, além da beleza e de ser pesada em referências à longa carreira de Shakira, este figurino – que conta ainda com detalhes e fechos dourados que remetem à coleção Medusa 95, da casa de costura – simbolizam o grande diferencial deste espetáculo, que é a união da objetividade costumeira de Shakira à moda de alta costura que ela aprendeu a valorizar nos últimos anos.

