“pude concretizar meus sonhos”
Durante estes dias ela está criando seu novo álbum enquanto espera, feliz, seu primeiro filho com o jogador Gerar Piqué. No meio tempo, arranjou tempo para esta entrevista, na qual fala de sua nova fragrância Elixir.
Não se deixe enganar pelo cabelo loiro, a saia curta e o dançar sexy . Como descobriram alguns dos homens mais poderosos do mundo, de Gabriel Garcia Marquez, que uma vez a descreveu como “criadora de sua própria marca de sensualidade inocente”, ao presidente Obama, que no ano passado a recebeu no Salão Oval para falar dos problemas de educação entre a população latina dos Estados Unidos, Shakira é uma caixa de surpresas que assombra, deslumbra e seduz.
Famosa desde a adolescência – já era um ídolo na Colômbia antes mesmo de terminar o colégio – a cantora superou sem maiores problemas todos os obstáculos que a fama coloca hoje em dia no caminho de seus escolhidos. Houve tropeços claro, um pequeno romance mal resolvido aqui ou um pequeno escândalo ali, mas nada que a tenha distraído de suas grandes paixões: a música e a filantropia.
Seu romance com o jogador Gerar Piqué, e sua recém-anunciada gravidez, assuntos que teriam lançado qualquer outra com menos perícia e experiência ao inevitável abismo dos tablóides, foram manejados por ela com discrição e, poderíamos dizer, até uma elegância que é admirável nestes tempos de narcisismo tão descarado. Quando, pouco depois de nossa entrevista telefônica pedimos a ela por email um pronunciamento sobre seu futuro filho, Shakira respondeu através de seu representante que não, mas obrigado, e assim nosso pedido caiu na caixa de orações não respondidas que dia a dia chegam de tantos jornalistas,
Quem poderia culpá-la? Sua vida vem sendo destrinchada pela imprensa durante anos, algo que para uma mulher inteligente como ela, uma mulher que tem interesses que vão além dos sapatos, a foto, o contrato, o namorado e até o próprio disco, pode resultar cansativo e até frustrante. A fama vazia não faz sentido para Shakira, e talvez por isso ela tenha decidido colocar a sua para trabalhar. Em 1996 criou a Fundação Pies Descalzos, em parte para buscar uma solução para sua Barranquilla nativa, uma cidade caribenha da Colômbia onde cerca de 50 por cento da população vive em pobreza e 43 por cento das crianças não têm acesso a educação. Hoje em dia seus megacolégios repartidos por toda a Colômbia acolhem quase oito mil crianças.
Além de sua influente carreira musical e sua considerável fortuna econômica, foi seu trabalho humanitário – ela é embaixadora da boa vontade da UNICEF – que a colocou mais uma vez este ano na lista das 40 mulheres mais poderosas do mundo segundo a revista Forbes, uma honra que ela recebe de um jeito muito Shakira, com uma mistura de orgulho, incredulidade e responsabilidade.
A cantora conversou com ‘Cosas’ como parte da campanha de divulgação de ‘Elixir’, seu terceiro perfume, recém-lançado ao mercado. E esse foi, obviamente, o primeiro tema em que tocamos com ela durante nossa conversa.
ADORO O MUNDO DOS AROMAS
– De onde saiu o nome Elixir?
-Eu o escolhi. Significa poção mágica, aliás. Os elixires eram usados com propósitos distintos na antiguidade, e um deles era a indução ao amor. Me parece que a finalidade última de uma fragrância é a de atrair, de sentir sem maiores esforços.
-Sedução em um frasco?
– Claro há muito de sedução e ele é, sobretudo, muito sexy. Tem também muita personalidade e uma aspecto muito aveludado, e isso faz com que as pessoas queiram se aproximar e cheirar mais. É um aroma que é diurno e noturno.
– Fazer um perfume é uma extensão de sua arte ou é simplesmente uma oportunidade comercial?
– Sempre fui uma pessoa muito olfativa, adoro o mundo dos aromas, dos sabores e o olfato. Por muito tempo procurei uma fragrância que se sentisse como uma segunda pele e não a encontrei até que desenvolvi meu próprio perfume. Esta é a grande vantagem: poder criar exatamente o que se estava procurando e não encontrava em lugar nenhum. Foi isso o que aconteceu no meu caso. Pude experimentar com as notas olfativas que mais me atraiam e de quebra ainda descobri o mundo das fragrâncias que me parece fascinante e que de algum modo se parece muito com o musical. Criar um perfume e criar música têm muitas coisas em comum.
SOU OTIMISTA
– Faz pouco tempo você apareceu mais uma vez como uma das quarenta mulheres mais poderosas do mundo na lista da Forbes. Que significado isso tem para você? O que você quer fazer com este poder?
-Sempre tive consciência de que uma pessoa exposta à fama e ao olho público deve levar consigo a responsabilidade de usar esta influência da melhor maneira possível. Há temas que são muito próximos do meu coração, como o de levar educação universal e de qualidade a todas as crianças que se encontram em áreas de conflito e em situação de vulnerabilidade e pobreza extrema. Esta é uma causa pela qual trabalho a cada dia através da Fundação Pies Descalzos e da Fundação Alas. Pretendo dirigir a atenção que possa estar focada sobre a minha pessoa e levá-la para este tema que é muito mais importante do que a minha música.
– De todos os conflitos e problemas da sociedade porque decidiu focar neste?
-Porque a educação é dos temas nos quais, através do investimento social, pode-se ver a luz no fim do túnel. Eu sou otimista. Confio na raça humana, confio que o mundo pode chegar a um lugar melhor, e me parece que a partir da revolução industrial e da democratização da educação chegamos onde estamos hoje, com tanto conhecimento e avanço tecnológico. Me parece que há muito mais adiante. Milhões e milhões de crianças estão fora do sistema escolar primário e secundário e necessitam contar com as oportunidades e ferramentas que todos deveríamos ter para conseguir uma vida digna. A educação é um veículo estupendo para conseguir uma sociedade muito mais justa e próspera, uma arma que devemos utilizar. Os líderes políticos e econômicos devem se comprometer com esta causa se realmente queremos um mundo globalizado e em paz.
-Não quero te empurrar para temas conjunturais, mas esta entrevista será publicada no Chile e gostaria de saber se tem alguma opinião sobre o conflito estudantil…
-Este é um assunto muito complicado e é preciso estar aí, ser chilena, e viver no país para poder opinar. Ainda assim, diria que apesar das discrepâncias e dos desacordos que possam existir em algum momento na sociedade, o importante é se manter unidos e não esquecer jamais que todos são irmãos, chilenos, e que é preciso pensar sobretudo no bem comum.
MAIS ALÉM DA FACHADA
-Você falou antes sobre sua própria educação, o colégio de freiras de Barranquilla onde gostava de fazer a dança do ventre… Como era sua época de estudante? O que as freiras pensavam de você?
-Eu era uma menina muito inquieta, muito criativa e tinha vontade de sair pelo mundo e mostrar minhas capacidades e meu potencial. Meus pais tiveram um papel fundamental nisso tudo porque sempre me apoiaram e se atreveram a sonhar com a mesma força que eu. Pude realizar meus sonhos, mas foi também porque recebi uma educação de qualidade apesar dos distintos momentos econômicos pelo qual minha família passou. Alguns bons, outros nem tanto. Meu papai pode ter tido problemas, mas educação foi algo que nunca nos faltou e que fez uma grande diferença na minha pessoa. Os bens materiais podem ir e vir, mas o conhecimento é um tesouro incomparável.
-Você cresceu em um país latino e em uma família árabe. Duas culturas bem machistas. Como isso afetou sua vida?
-De certa forma, em uma indústria tão competitiva e tão difícil como a da música e como ocorre em qualquer campo profissional, a mulher deve demonstrar suas capacidades constantemente. É preciso convencer de que há algo mais além do exterior, da fachada. É preciso convencer a todos de seu potencial, transcender todos os preconceitos e demonstrar do que é feita. Nisto sempre contei com o apoio de minha família e foi minha melhor ferramenta para conseguir o que conquistei até hoje.
-O fato de ser bonita, sexy e explorar um pouco seu lado sensual levou a confusões a respeito de quem você realmente é?
-Acredito que uma mulher não confunde, intriga. Uma mulher que goste de pensar, analizar e compartilhar suas opiniões sempre será escutada. Sempre haverá um homem interessado em te escutar, especialmente se você entender de futebol! Aí todos os homens te escutam.
– O que você pode dizer de seu próximo álbum? O que o difere dos anteriores?
-Estou no meio do processo criativo, experimentando muitas coisas. Neste momento estou concentrada e escrever letras e esta é uma parte do processo que requer muita concentração de minha parte. Me ocupo muito de encontrar as palavras que melhor possam mostrar o que quero transmitir; talvez isso seja algo que todos os meus discos têm em comum. Na parte musical, sempre quero revolucionar em sons, investigar em ritmos, trabalhar com diferentes artistas, Há muita gente com muito talento para isto com as quais adoro dividir este processo.
– O que te interessa neste momento em termos de cultura popular? O que está lendo, vendo ou escutando?
-Estou lendo dois livros neste momento. Um é ‘A História da Arte’, de E. H, Gombrich e o outro se chama ‘Happy for No Reason’ (sem tradução para o Português). De música não estou escutando muito, porque estou concentrada em meu próprio disco.
Tradução: Josimar Rosa para Shakira Brasil